quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Por uma nova política económica - II


   por Fernando Medina / Jornal de Negócios
 
 

A realidade impõe pois uma nova política económica, fundada na renegociação credível e realista do nosso ajustamento. Uma política que na frente financeira, do défice e da dívida, tenha condições de suportar e enfrentar a recessão interna e a prolongada estagnação externa.
 
Perante uma realidade muito mais negativa do que o expectável aquando da assinatura do Memorando com a Troika – queda abrupta da procura interna, desaceleração forte da procura externa, valorização do euro e desalavancagem financeira mais rápida – insistir na mesma receita é caminho certo para agravar a destruição económica e social e reduzir as hipóteses de recuperação do país. 

As actuais projecções do Governo para 2013 dão conta disto: o PIB será 6% inferior ao de 2010 (há ano e meio previa-se -3%), o investimento será 28%(!) inferior (antes -15%), as exportações subirão 15% (antes 20%), o desemprego chegará a 16,4% (antes 13,3%) e a dívida pública a 122% (antes 115%).

A realidade impõe pois uma nova política económica, fundada na renegociação credível e realista do nosso ajustamento. Uma política que na frente financeira, do défice e da dívida, tenha condições de suportar e enfrentar a recessão interna e a prolongada estagnação externa, ao mesmo tempo que, na frente económica, tenha a ambição e os instrumentos capazes de promover a recuperação do país.

São três as linhas centrais e complementares desta nova política (trataremos hoje da primeira): a estabilização da economia, a melhoria da competitividade, e a renegociação da dívida.

O instrumento central para a estabilização é um Acordo de Rendimentos capaz de reduzir a incerteza das famílias, travar o empobrecimento e lançar as bases de recuperação da procura interna. Este acordo deve assumir, por um período de 3 anos, p.ex.: (i) a estabilização do quadro fiscal e das principais prestações sociais, e a sua melhoria em função da situação económica e da recuperação das receitas fiscais; (ii) o aumento dos salários em torno dos ganhos de produtividade e da situação geral; (iii) a recuperação do salário mínimo e das prestações de combate à pobreza; e (iv) um quadro credível de regresso à constitucionalidade quanto a pensões e salários da função pública.

A estabilização da economia impõe, ao mesmo tempo, o abandono da actual política de austeridade cega em favor de uma política de melhoria estrutural das finanças públicas.

Isto significa não proceder à aplicação de novas medidas de austeridade em caso de incumprimento das metas orçamentais este ano, e muito menos ao anunciado corte de 4.000 milhões de euros. Mas significa também assumir as reformas necessárias para que as nossas finanças sejam compatíveis com cenários de baixo crescimento, i.e., retomar as políticas de reforço da sustentabilidade e equidade do Estado Social, e as de modernização e eficiência do Estado.

Refira-se só a título de exemplo: (i) o alargamento da base fiscal com redução da fraude e evasão e possível redução de taxas (ex. IRC); (ii) a aceleração da convergência de regimes de pensões; (iii) a unificação de todos os tipos de pensão e aumento da eficácia da condição de recursos para prestações não contributivas; (iv) o avanço nas redes de cuidados primários e continuados com adequação da rede hospitalar e dos protocolos terapêuticos no SNS; e (v) a reestruturação e saneamento do Sector Empresarial do Estado. Para estes fins pode e deve recorrer-se a receitas extraordinárias.
Dirão os críticos que esta abordagem aumentará o défice e a dívida, mas a verdade é que os riscos são bem menores que os da actual política. A estabilização da economia trará não só uma recuperação significativa da base fiscal no curto prazo, como os ganhos financeiros de medidas estruturais serão bem mais importantes, eficazes e duradouros que os da política em curso (veja-se que em 2012 a austeridade foi de cerca de 5,3% do PIB, para uma consolidação real de cerca de 1%, que se reduz a quase 0 se considerarmos a natureza temporária dos cortes de pensões e salários). Isto sem referir a incomparável diferença na situação económica e social, nem as possibilidades decorrentes da renegociação do ajustamento (em particular da dívida) que já defendemos.

Economista. Deputado do PS

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