terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Portugal: cada dia pior

por MÁRIO SOARES | Diário de Notícias


É incontestável que o nosso querido Portugal cada dia está mais empobrecido e pior. Todos os portugueses, até os ricos, veem isso e começam a estar desesperados. As doenças e as mortes repetem-se. Muitos passam fome e dormem nas ruas.
A classe média aos poucos está a desaparecer. As televisões, as rádios, os jornais e os jornalistas que neles trabalham não podem deixar de saber que o governo está paralisado e sem qualquer visão do futuro. Embora o senhor primeiro-ministro diga, com o seu habitual otimismo, que tudo vai bem, como dizia Pangloss no tempo do terramoto.
A verdade é que o Estado português - e os seus diferentes ministros - estão cada vez mais aflitos sem saberem como arranjar recursos para cumprir o que lhes parece necessário.
Na última semana foi o caso do ministro da Saúde, com as doenças terríveis dos que esperam em vão nos hospitais, sem médicos, enfermeiros e dinheiro para comprar os medicamentos necessários.
Será que ainda existe o chamado - e em anteriores tempos tão útil - Serviço Nacional de Saúde? O senhor ministro Paulo Macedo, contabilista de profissão, parece dizer que sim. Mas será que os doentes que esperam até à morte, nos corredores dos hospitais, sem serem atendidos - e os seus familiares - acreditam nisso? As desgraças que se têm visto nas televisões obrigam-nos a pensar que não.
E, contudo, até há um ano atrás, ainda se dizia, entre os portugueses mais desesperados, que o ministro da Saúde era o menos mau. E hoje, com tanto otimismo do primeiro-ministro e o silêncio do Presidente Aníbal Cavaco Silva, não podem deixar, sem mentir, de dizer não. Tanto em relação ao primeiro-ministro Passos Coelho como ao vice-primeiro-ministro Paulo Portas. Pois trata-se de um governo de coligação, embora não se saiba se irão concorrer juntos nas próximas eleições.
Ver-se-á o que então se irá passar. Mas não creio que seja muito difícil adivinhar que a vitória será do PS...
VOLTO A FALAR DE SÓCRATES
Preso desde novembro até hoje, dia 10, ninguém sabe porquê e até quando irá continuar a prisão, sem qualquer julgamento prévio. É algo que cada dia mais indigna os portugueses, quer o estimem ou não. O que os portugueses sabem é que os que roubaram, lesando o país, estão à solta. Por isso é que cada dia são mais os que querem visitar o ex-primeiro-ministro.
Será que os procuradores da Justiça e os respetivos juízes têm sensibilidade para conhecer a indignação que cada vez mais ocorre nos portugueses que admiram Sócrates e mesmo naqueles que sem o conhecer só o estimam por saberem que foi um excecional primeiro-ministro durante seis anos? É difícil responder.
Havendo um total silêncio sobre o caso da parte do Presidente da República, que trabalhou com Sócrates, como primeiro-ministro, duas vezes eleito pelo povo português, e pela parte do governo, que só foi eleito depois da demissão pessoal de Sócrates...
A GRÉCIA E A ALEMANHA
Quer se queira quer não, a Grécia voltou a ser, após tantos séculos, com o primeiro-ministro Tsipras e o seu ministro das Finanças Varoufakis, um excecional economista e como tal reconhecido, um motivo de debate na União Europeia.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, como eu disse há uma semana neste mesmo jornal, saudou o novo líder grego e espontaneamente ofereceu-se para o ajudar.
Dias depois, os dois ministros das Finanças, o grego Varoufakis e o poderoso Schäuble, alemão, que tanto tem apoiado a senhora Merkel na austeridade, a todo o custo, o que só tem feito estragos na Europa dos Estados do Sul, encontraram-se e, como era de esperar, não se entenderam.
Realmente a Alemanha já não manda como antes na União Europeia, e a Grécia, de Tsipras, deixou de se humilhar como no passado e afastou a fatídica austeridade, o que levou Schäuble a dizer, cito: "Só concordámos em discordar." Ainda bem!
Na verdade os tempos são outros e tudo está a mudar na União Europeia. Francamente para melhor.
Espero que o governo português, que ainda mantêm a austeridade, perceba que deve mudar também e quanto antes, sob pena de ficar, até às próximas eleições, num isolamento total em termos europeus. Porque nem a própria Merkel, que já não é o que era, lhe poderá valer. E que deixe cair a austeridade, que mata, como disse o Papa Francisco.
Tsipras, como se viu, manteve-se firme na intervenção que fez no Parlamento grego no passado domingo.
A SECA NO BRASIL
Sou conhecido no Brasil - o que muito me honra - como um grande amigo desse país. Não só porque é um Estado lusófono mas porque gosto de tudo no Brasil: das paisagens, das pessoas, da cultura tão rica, do Carnaval...
Das múltiplas visitas que fiz ao Brasil, tive a oportunidade de conhecer muitos estados, de norte a sul, mas infelizmente não todos, porque o Brasil é imenso. Contudo, tive a oportunidade de descer o grande rio Amazonas de Manaus até ao mar.
Lembro que os portugueses subiram a remos aquele rio, encontrando nas margens, de quando em quando, os índios, o que é qualquer coisa de extraordinário e inesquecível.
Hoje o Brasil é um imenso país lusófono. O maior de todos e porventura dos mais visitados, entre os Estados da Lusofonia. Todos independentes e integrados na CPLP. Ao contrário do Reino Unido, que nunca permitiu que os Estados Unidos pertencessem à Commonwealth...
Vem isto a propósito do Brasil viver hoje uma situação difícil por causa da seca que o está a afligir em virtude da falta de água, não só em São Paulo, onde começou, mas também agora no Rio de Janeiro e em Brasília, capital do Brasil. É uma situação muito grave. Todos os Estados da Lusofonia o devem apoiar, como puderem.
MANUEL LUCENA
Faleceu há dias o meu querido amigo que foi um grande cientista e um sociólogo eminente.
Foi igualmente um convicto antissalazarista que teve de se refugiar em Itália, onde o conheci. Mas não era de fácil convívio.
Foi um católico progressista e, com Alçada Baptista, foi um dos fundadores de O Tempo e o Modo.
Há muito tempo que o não via, segundo julgo, desde a morte de Bénard da Costa. Muito mais novo do que eu, morreu inesperadamente, o que me deu uma enorme tristeza.

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