sexta-feira, 21 de março de 2014

Equinócio da primavera | Maria Teresa Horta

 

É o tempo dos pequenos ventos
começarem a contornar, enrodilhar
as árvores num longo arrepio diurno


A claridade ondula, desdobra-se, esfia-se
e logo se esfiapa, espalhando as sementes
num curto silvo áspero e vertiginoso

I

Equinócio da Primavera
reconhecem os amantes

Encostados em longas
almofadas dormentes

Saindo da penumbra a raposa lambe o sol
com a sua língua de prata a detectar
o sabor dolente das chuvas fracas e recentes

Reconhecendo os novos odores almiscarados, o seu
pelo fulvo possui o tom da chama acre pontilhando
de ocre as clareiras das matas ávidas de seiva

II

Equinócio da Primavera
lembram-se os amantes

Enquanto mergulham nas frias águas
dos lagos, que devagar se libertam dos gelos

Ao longe renascem os ruídos que se reconhecem
a si mesmos e onde já dançam as asas fulvas
e os raios de uma luz esgarçada enquanto

Por entre os silvados e na folhagem incipiente
surgem os bagos, as bagas, os caules tímidos
e assustados das longas flores oscilantes e lívidas

III

Equinócio da Primavera
sabem os amantes

Escutando os corpos inquietos
deitados nas grandes pedras polidas

Quem são as mulheres que correm
com os lobos nas florestas
adivinhando a lua pelas frestas das árvores?

Tal como as águias, as constelações cintilantes
ao longo das noites vazias
têm um imenso olhar que a si mesmo se despe

IV

Equinócio da Primavera
murmuram os amantes

No momento exacto em que
o sol cruza o equador celeste


(inédito)

Sem comentários:

Enviar um comentário