domingo, 1 de setembro de 2013

Leituras

Novo ciclo, novo resgate

 

No passado mês de Julho, com a demissão de Vítor Gaspar e as piruetas de Portas, o País mergulhou numa crise que Cavaco tentou por todos os meios que não descambasse em eleições antecipadas. Não se podia juntar uma crise política à crise económica, pois as consequências podiam adivinhar-se: os mercados não perdoariam e o segundo resgate seria mais do que certo. E lá acabou por segurar o Governo, mesmo sem o consenso que tinha exigido aos partidos do Governo e ao PS. Pois bem, passado pouco mais de um mês, Cavaco tem dúvidas quanto à legalidade da chamada requalificação dos funcionários públicos e pede a fiscalização ao Tribunal Constitucional que acaba por chumbar a lei. Conhecida a decisão, o Governo não perde um segundo e imediatamente responsabiliza o Tribunal por todos os males que nos possam vir a acontecer, incluindo a possibilidade de um segundo resgate. Curiosamente, Cavaco, que foi quem questionou a legalidade da lei, fica de fora dos ataques da direita. Cavaco não é uma força de bloqueio. Percebe-se. Não se percebe é que Cavaco segure o Governo com a desculpa de não se poder agravar a crise económica e permita que o primeiro-ministro já esteja novamente a ameaçar com um segundo resgate. Até porque, em princípio, Cavaco terá avisado o Governo da sua intenção de enviar o diploma para o TC. Ou não? Uma coisa sabemos: apesar de tanto o exigirem aos outros, aparentemente, não houve consenso entre ambos.
 
Enfim, longe vão os tempos em que as relações entre um certo primeiro-ministro e o Presidente da República eram analisadas à lupa. Tempos em que o primeiro-ministro era obrigado a ouvir e a acatar todos os ensinamentos que Sua Excelência lhe transmitia nas reuniões semanais em Belém sob pena de ser acusado, por toda a oposição e por um verdadeiro exército de comentadores, de ter tiques totalitários, de ser arrogante e de não ouvir ninguém…
 
guida.
Blog Aspirina B
 
 

Uma ilusão chamada “velho PSD”

Expresso, 24 de Agosto de  2013

Em vésperas do 25 de Abril, um grupo de políticos afastou-se apressadamente da Acção Nacional Popular para poder reaparecer após a implantação do regime democrático sob uma nova veste. A agitação posterior revelou que a designação escolhida — Partido Popular Democrático (PPD) — não era a mais apelativa para se alçar ao poder. Por isso, a formação recém-criada foi então rebaptizada (com um erro ortográfico para todo o sempre): Partido Social Democrata (em lugar de Democrático).

Este grupo de políticos e profissionais liberais, que se uniu para representar a finança e a grande indústria, atraiu a si as forças vivas recauchutadas do Estado Novo e as camadas da população atemorizadas pelo inócuo preâmbulo da Constituição (“abrir caminho para uma sociedade socialista”): catedráticos e analfabetos, patos bravos e publicistas, chupistas do Estado e cantores-pimba, negociantes de ocasião e autoridades locais.

É esta amálgama quase obscena que permite ao PSD aparecer com sucessivas máscaras — até como pregoeiro da “social-democracia”. A verdade é que ter ilusões sobre a sua natureza só conduz a deixar a esquerda desarmada. Vê-se com alguma frequência figuras proeminentes da oposição a fazer apelos ao “velho PSD” — como o fez João Ribeiro, porta-voz do PS, numa entrevista ao Expresso na última semana (na resposta reproduzida na imagem acima).

Acontece que o “velho PSD” anda por aí em peso. Salvo a circunstância de as suas figuras se gabarem de ser mais competentes do que estarolas de Passos Coelho, que alterações de política propõem eles? Nenhumas.

Com efeito, na “Universidade” de Verão do PSD, Marcelo subiu ao palanque para serenar as hostes após o chumbo do Tribunal Constitucional, garantindo que se há-de arranjar forma de despedir os trabalhadores do Estado. Também na “Universidade” de Verão do PSD, Alexandre Relvas, o afamado Mourinho de Cavaco, atiçou, perante o olhar incrédulo dos jotinhas, os filhos contra os pais, apelando a uma total desregulação do mercado de trabalho: “é pais a viverem à conta dos filhos” [sic], disse o protegido de Cavaco. No mesmo local, Leonor Beleza retomou o apelo do Dr. Relvas à emigração dos jovens. Santana Lopes defendeu a necessidade de uma revisão constitucional para o país poder ter uma “constituição que seja neutra, que seja isenta e independente” [sic], tema agarrado por Paulo Rangel para sustentar que a Constituição tem uma “visão demasiado conservadora”.

Onde está o “outro” PSD?
 

 
 

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