
À esquerda, aparecem, em simultâneo, dois movimentos à margem dos partidos: o ‘seu’ Manifesto para Uma Esquerda Livre e o Congresso Democrático das Alternativas. Não há o risco de se anularem?
Não. Um reforça o outro. Metade dos subscritores do manifesto estarão também no congresso. Fazem parte de um sector que eu chamaria de ‘o meio da esquerda’. É o sector crucial da esquerda, assim como a alavanca do Arquimedes – quando se empurra numa ponta e na outra não se gera movimento nenhum. O ponto de apoio dessa alavanca [o seu ‘segredo’ para funcionar] é o ‘meio da esquerda’ e ele conseguirá – não levantar o mundo (risos) – mas o sistema político em Portugal.
Onde se situa essa zona do ‘meio da esquerda’?
É, sobretudo, a ala social-democrata do BE e a ala esquerda do PS. Apesar de ser o maior reservatório de ideias à esquerda, tem estado sobre tutela partidária. Há receio em levantar a voz. E quem quer fazer pontes, entendimentos interpartidários, é acusado por isso. Onde chegámos!
Rui Tavares
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Vale bem a pena ler a entrevista que Rui Tavares deu ao Sol. Estamos perante a exposição da desilusão de uma das coqueluches do BE, da comunicação social politizada e da esquerda em geral. O Rui tem representado essa promessa de renovo à esquerda que recusaria os supostos vícios e inércias de um PS anquilosado pela prática do poder e pela derrelicção ideológica, ao mesmo tempo que não caía na esterilidade soviética do PCP. Naturalmente, o seu espaço de afirmação seria ao lado de Louçã, alguém que reclamou a posse desse território imaginante já desde os tempos do PSR. Foi, com toda a naturalidade, seduzido para servir o BE num acto eleitoral que lhe valeu uma bolsa de estudo em política internacional no Parlamento Europeu. Todavia, logo em 2010, segundo conta, já o amor tinha dado lugar à traição e o casamento entrou em dissolução.
O Rui diz que está zangado com os partidos, mas continua a ser nos partidos que vê o caminho. Tratar-se-á, então e como sempre, de conseguir colocar as pessoas certas nos lugares certos. Ele sabe que essas pessoas existem, ou não fosse ele uma delas, pelo que se oferece para as identificar, convocar e juntar. Muito bem e felicidades nessa empresa, companheiro. Só me parece algo assim para o muitíssimo duvidoso que essa vontade de reforma partidária não venha acompanhada pelo diagnóstico histórico do que aconteceu em Portugal de 2005 a 2011. Afinal, o Governo de Sócrates que foi boicotado por toda a esquerda não democrática, incluindo a ala esquerda do PS, com as consequências de termos uma direita irresponsável e fanática com o poder todo na mão, não correspondia ao ideal social-democrata que se reclama para este novo centro da esquerda? É que se não correspondia, terá de se considerar que Sócrates – e quem com ele lutou por um Portugal de riqueza humana, desenvolvimento científico e excelência produtiva – era de direita. E, se Sócrates for julgado como pertencendo à direita por quem esteja no “meio da esquerda”, então, Rui, reinará uma enorme confusão na tua cabeça em relação a alguns dos nomes com que te identificas.
Não se pode fugir ao centro, pois o centro é inevitavelmente o lugar onde estamos, onde cada um está. Precisamos é de começar a medir a profundidade que suporta o centro que se queira habitar, a extensão do centro proposto como preferível a qualquer outro, a altura que cada centro permite atingir.
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