sábado, 10 de novembro de 2012

Agora querem esconder Paul Ryan

Paulo Moreira Leite | Época


O esforço para explicar a eleição americana pela identidade das raças nos EUA é patético.
Diz-se que Obama venceu porque teve mais votos entre negros, hispânicos e mulheres, enquanto Romney ficou à frente entre brancos.
O pessoal acredita no tal de racialismo e depois precisa justificar.
É patético porque não resiste sequer à matemática. Os cidadãos considerados “brancos”, nos EUA, representam 72% da população. Os negros, 13,1% e os hispânicos, 12,8%. Metade do eleitorado que deu a vitória a Obama era “branco.”
Ou seja: se Obama tivesse recebido todos os votos negros e hispânicos, apenas, teria sofrido uma derrota fragorosa, como diziam os comentaristas esportivos de antigamente.
O debate eleitoral envolveu crescimento econômico, criação de empregos. E envolveu conflito entre pobres e ricos, como sublinhou o New York Times.
E é isso que se pretende esconder.
É óbvio que as linhas de raça e renda se confundem, porque são um produto histórico. Nós sabemos quem mora nos bairros pobres, frequenta as piores escolas…E é certo que após uma história de discriminação e preconceito, Obama é uma personalidade com grande significado, que vai além do político.
Considere o Estado que decidiu a eleição. Ohio foi o local onde o plano de Obama de recuperação da indústria automobilística – tão criticado por aquela turma da austeridade a custa do emprego dos pobres, você conhece este pessoal – garantiu 150 000 empregos de qualidade.
Neste Estado, de 11 milhões de habitantes, os brancos têm uma maioria ainda maior do que a média nacional: 9 milhões de pessoas, ou 85% da população.
Obama ganhou por 3 a 5 entre os eleitores de renda mais baixa. Teve 60% dos votos entre trabalhadores da indústria. Também teve apoio junto a professores e funcionários públicos, alvo da hostilidade de um governador republicano.
Na Virgínia, outro Estado onde a vitória foi importante para Obama, os brancos são 65%.
Quem prestasse atenção em discursos de Obama na campanha iria dizer que ele fez uma campanha horrorosamente populista. Coisa de deixar certa turma com enjôo.
Num dos últimos dias de campanha, Obama disse coisas como : “O pessoal de cima não precisa de defensores em Washington. Eles tem lobistas…Eles tem milhões… Mas as pessoas que precisam de defensores são os americanos que me mandam cartas que eu leio todas as noites.”
Em 2012 o racismo foi o argumento da direita, que sem muita sutileza procurou reunir o eleitor branco em cima disso.
Na Fox News, um apresentador chegou a lamentar em raivosa nostalgia que não se vive mais na “América tradicional…” Foi um pequeno escândalo, pois todos sabem a qual tradição se referia.
Também reclamou que 50% dos eleitores querem ganhar “coisas” do governo e Obama faz isso por eles. Esses populistas não se emendam, não é mesmo?
Falar em raça, hoje, é a melhor forma de esconder o repúdio obtido pelas ideias do vice republicano Paul Ryan, fanático do Estado mínimo. Seu fiasco se compara a Sarah Palim, que também foi colocada embaixo do tapete depois da
derrota de 2008.
Apresentado como a grande novidade da eleição, Ryan não deu a vitória republicana sequer no Winsconsin, seu Estado Natal. Até no Senado seu partido perdeu, embora tivesse apresentado um antigo governador e ex-secretário de George W. Bush na disputa. Acabou vencido pela concorrente democrata, a primeira lésbica assumida a chegar ao Senado. Não é de surpreender tamanha impopularidade. Ryan é da turma que era contra o Estado de Bem-Estar Social antes dele existir. Selvageria em estado puro. É contra Roosevelt.
No fim, ao ver aonde a coisa pegava, Romney entrou no debate sobre criação de empregos, chegando a acusar Obama, falsamente, de vender a Chrysler para os italianos, transferir as fábricas do Jeep para a China…
A vitória de Obama envolveu política econômica e direitos sociais. Ele já tinha maioria entre o numeroso eleitorado com mais de 65 anos, quase do tamanho de toda população negra. Por que? Por causa do Obamacare.
Quando Romney e Ryan anunciaram que tinham um plano de saúde privado, e dariam vauchers para os necessitados, seu apoio entre os mais velhos caiu de 19% para 9%.
A campanha contra o aborto – um candidato republicano chegou a dizer que filho de estupro expressa a vontade de Deus – ajudou a explicar ao menos uma parte dos votos de Obama entre as mulheres, onde também foi vencedor. (Elas são, nos EUA e no mundo inteiro, mais numerosas do que os homens…)
O alvo real de Obama era o eleitor com menos de 30 anos e renda anual de até US$ 50 000, considerada média pelos padrões americanos. As pesquisas mostram que ganhou a discussão aí. Ignorando a turma do impostômetro, esses cidadãos querem que os ricos paguem mais impostos para equilibrar as contas. Acham errado promover cortes nos serviços essenciais, como querem os defensores do deixa quebrar…
Embora tenha causado menos empolgação entre os jovens do que em 2008, Obama cravou diferenças importantes entre eles em Estados decisivos.
Fez 21 pontos de vantagem na Florida, 29 em Ohio, 21 na Virgínia. Por que? Possivelmente porque pretende manter e ampliar créditos educativos, enquanto o adversário queria cortá-los. Young populism, não é mesmo?
Vitorioso em 1932, quando os Estados Unidos afundavam na depressão iniciada em 1929, Franklin Roosevelt acusou o adversário de ser partidário da política do “nada ouço, nada vejo, nada faço…”
Obama está muito longe de Franklin Roosevelt. Sua vitória foi indiscutível mas a vantagem não foi grande.
Mas está claro que o máximo que Romney poderia fazer na campanha era nada. Ganhou um debate. Foi muito.

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